terça-feira, 20 de julho de 2010

A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO JUNTO AO INDIVÍDUO COM PARALISIA CEREBRAL

Obs.Esse artigo foi escrito por mim em 1997, quando ainda utilizávamos o termo indivíduo portador de deficiência. Portanto o texto original encontrado no site da Revista Catharsis ainda contém esse termo.





Renata do Carmo de Assis Trugillo

"Se eu não podia ser como as outras pessoas, pelo menos seria eu mesmo, da melhor maneira possível". Christy Brown - My left foot.



A paralisia cerebral pode ser definida como um prejuízo permanente da postura e do movimento resultado de uma desordem encefálica não progressiva (Schwartzman - 1993). As causas da paralisia cerebral são várias, mas frequentemente encontramos: - problemas durante a gravidez (anemia grave da mãe, hemorragias diabetes, etc). - problemas durante e logo após o parto (rubéola, nascimento prematuro, icterícia grave, etc.) - problemas do nascimento até os dois anos de idade (asfixias, infecções do sistema nervoso central como meningites, por exemplo). Há alguns fatores que podem aumentar o risco de surgimento de paralisia cerebral: - convulsões - baixo peso fetal - gestantes de alto risco (com hipertensão ou diabetes, por exemplo). - idade materna (acima de 40 ou abaixo de 16). Grande parte da psicologia do deficiente está intimamente ligada a psicologia social, ou seja, da interação desse indivíduo com outras pessoas e no ambiente próprio de cada um. Dessa forma, o indivíduo portador de paralisia cerebral será menos limitado pela sua deficiência que pela atitude da sociedade em relação à deficiência. Há uma história espanhola que pode ilustrar isto. Fala a respeito de uma terra em que seus habitantes um a um passam a desenvolver caudas. Os primeiros habitantes que passam a desenvolver tal coisa, semelhante a dos macacos, fazem o que podem para escondê-la. Desajeitadamente enfiam suas caudas em calças e camisas largas a fim de ocultar sua estranheza. Mas ao descobrirem que todos estão desenvolvendo cauda, a história muda de forma drástica. Na verdade, a cauda revela-se de grande utilidade para carregar coisas, para dar maior mobilidade, para abrir portas quando os braços estiverem ocupados. Estilistas de moda começam a criar roupas para acomodar, na verdade, acentuar e libertar as recém-formadas caudas. Logo começam a usar adornos para chamar a atenção a esta novidade. Então, de repente, aqueles que não desenvolveram caudas são vistos como esquisitos e começam freneticamente a procurar formas de esconder tal fato comprando caudas postiças ou retirando-se completamente da sociedade de "cauda". Que vergonha, não ter cauda! Essa influência da sociedade em excluir o diferente pode ser observada no comportamento de crianças pequenas que parecem não terem sido influenciadas pelos padrões da sociedade. Brincam livremente com as crianças diferentes: somente após incorporarem os padrões culturais de perfeição e beleza que passam a zombar da criança de olhos vesgos, do garoto chamando-o de "retardado" ou imitando a gagueira ou a deficiência física dos outros. É a atitude da sociedade, na maior parte das vezes, que definirá a deficiência como uma incapacidade e é o indivíduo com  deficiência que sofrerá as conseqüências de tal definição.

A FAMÍLIA De acordo com Meyer (Família Dinâmica - 1987), a família pode ser considerada como uma unidade sócio-econômica organizada em torno de um par heterossexual em que o padrão de atitiude deste grupo estará relacionado ao meio ambiente cultural, ao mesmo tempo em que irá definir os papéis de seus membros e estabelecer as bases de suas interações. A partir do momento em que nasce uma criança com paralisia cerebral e esta é trazida para a casa, o clima emocional da família se transforma. Grande parte da reação inicial a esta notícia será determinada pelo tipo de informação fornecida, a forma como ela é apresentada e a atitude da pessoa que faz a comunicação. Estes aspectos citados serão bastante relevantes podendo determinar a aceitação desta criança no núcleo familiar. É pouco adequada a atitude dos pais em tentar disfarçar os fatos a fim de amenizar o choque dos familiares, principalmente em relação as crianças que conhecem tão bem a "psicologia" dos pais e sentem quando estão sendo enganadas. É fato que existem outros fatores que afetarão o papel da família na aceitação ou rejeição da criança portadora de paralisia cerebral. Um exemplo seria a forma como essa família enfrentou problemas sérios no passado, isto estará intimamente ligado ao modo como lidará com novos problemas. A presença de uma pessoa deficiente continuará a trazer dificuldades no meio familiar que exigirão de cada membro deste núcleo, redefinições de papéis e mudanças, mesmo após a absorção do impacto inicial.




OS PAIS As pessoas se casam, tem filhos e se tornam pais. É importante que não nos esqueçamos que os pais são, antes de tudo, seres humanos. Não podem ser separados da condição de pais, mas - ter um filho é apenas uma parte do complicado papel desempenhado por um indivíduo. Todos os pais que aguardam o nascimento de um filho idealizam essa criança que está por vir ao mundo, seja nos aspectos físicos ou comportamentais deste novo ser. Nos primeiros dias após o nascimento da criança é importante que os pais possam conciliar a imagem do bebê que formaram no período da gravidez (bebê idealizado) com as impressões que elas passam a ter deste bebê real. No caso de casais que venham a ter uma criança com paralisia cerebral este momento é muito mais difícil. Assim, alguns mecanismos de defesa surgem no psiquismo destes pais e são manifestos em comportamentos tais como: - pais negam a importância do problema. Após alta da maternidade médicos encaminham para avaliação em centro de reabilitação e os pais não realizam tal coisa. Negação. - pais projetam a culpa sentida por eles próprios em pessoas próximas, geralmente nos profissionais envolvidos com a criança. Em alguns casos, colocam a culpa no próprio cônjuge. Projeção. - Pais afastam-se do bebê, não por que não se preocupem, mas porque é doloroso demais preocupar-se tão profundamente e sentir-se ao mesmo tempo tão completamente impotente. Rejeição. Os filhos, cujos pais apresentam esse com portamento de rejeição podem desenvolver sentimentos que interfiram em seu comportamento tais como: ansiedade, tensão, sentimentos de inferioridade, auto conceito negativo, insegurança, falta de confiança em si, falta de iniciativa. - Mãe (geralmente nota-se esse tipo de comportamento nas mães) não permite que o filho sofra o mínimo de frustração que é importante para o seu desenvolvimento. Dessa forma, ela deixa de lado sua vida e passa a dirigir toda a sua atenção a esse filho. Freqüentemente essa mulher passa a ter dificuldades no seu relacionamento conjugal e com os outros filhos. Ela não se sente digna de ter um momento para si, não consegue uma descarga adequada para as suas tensões e seu conflito aumenta. Superproteção. A criança que a mãe manifesta esse tipo de conduta pode desenvolver comportamentos como: possessividade e egocentrismo, baixa tolerância à frustração, revolta ou apatia. É comum observarmos nesses pais sentimentos naturais de medo, dor, desapontamento, culpa, vergonha, frustrações e uma sensação geral de incapacidade e impotência. Todos esses sentimentos são naturais, pois são raros os seres humanos que poderiam aceitar de imediato um filho portador de uma deficiência. Durante a orientação psicológica desses pais é imprescindível a criação de um espaço emocional para que esses sentimentos sejam livremente expressos e elaborados, visando uma aceitação do seu filho, pois somente dessa forma os pais poderão ajudar essa criança a conviver com a realidade.



O INDIVÍDUO COM DEFICIÊNCIA No que se refere a personalidade, não existe um tipo ou tipos que definam os indivíduos  com deficiência física. O único ponto em comum entre os indivíduos com deficiência é a própria limitação, ou seja, todos apresentam um déficit que os discrimina da população "normal". Cada indivíduo é um todo integrado e funcional; dessa forma deve ser compreendida sua estrutura de personalidade. Esta é formada por traços herdados e adquiridos: dessa forma a personalidade de um indivíduo apenas poderá ser entendida mediante a totalidade de seus diferentes aspectos: bio-psico-sociais. A deficiência física será vivenciada de formas diversas de acordo com a estrutura de personalidade de cada um. Assim alguns encaram a deficiência como um desafio a ser superado com novas formas de adaptação, busca de outros referenciais. Outros mostram reações negativas de acomodação à situação com momentos depressivos e de angústia. De uma forma geral a deficiência significa: limites de ação e expansão pessoais e conseqüentemente acaba por segregar o indivíduo do convívio social, afastando-o das oportunidades normais de realização (pessoal, profissional, social, afetiva, etc.) Especificamente no caso das crianças com paralisia cerebral, elas apresentam uma deficiência quanto a consciência de seu próprio corpo: isto devido a dificuldade em relação de seus membros e o seu centro de gravidade que geralmente está sujeito a oscilações. Isto pode levar a uma distorção da noção real de espaço, uma dificuldade de adaptação dessa criança ao mundo nas suas relações de espaço, tempo e relações interpessoais O medo de cair, a aflição ao falar, a insatisfação por não conseguir realizar tarefas trazem momentos de insegurança e ansiedade para essas crianças. São inúmeras as limitações que perturbam e dificultam o desenvolvimento harmônico da personalidade das crianças portadoras de deficiência. A situação de deficiência favorece o aparecimento de estados freqüentes de depressão, insatisfação, insegurança, reações de agressividade, impulsividade, baixa tolerância à frustração. O sentimento de frustração pode levar a comportamentos como: agressividade, desconfiança, ansiedade, condutas regressivas, impaciência, depressão, inveja, bloqueios, fuga, dificuldade de adaptação social. Outro fator importante, que os profissionais de reabilitação, devem considerar, ao trabalharem com indivíduos portadores de deficiência é o nível de expectativa desses pacientes. É imprescindível estimular o indivíduo no sentido de levá-lo progressivamente a atingir melhoras, às crianças é de grande valor esclarecer-lhes sobre as conseqüências de sua deficiência, ajudando-a a conviver com ela e superar suas limitações. O mais importante é manter o nível de expectativa, dos indivíduos portadores de deficiência, dentro da realidade. Ao avaliarmos os aspectos de personalidade da criança e observarmos a necessidade de um acompanhamento psicológico utilizamos a ludoterapia. Esta técnica tem a finalidade de proporcionar um espaço para que a criança possa expressar suas fantasias, desejos e experiências de uma forma simbólica através de jogos ou brinquedos. Sabemos que brincar é o meio de expressão mais importante da criança. De uma forma geral, os objetivos da ludoterapia são: produzir alívio de tensões para a criança, melhorar suas relações com os pais e outros adultos significativos e torná-la socialmente mais adaptada sem se tornar dependente ou passiva. Em outro momento realiza-se, além da avaliação da personalidade do indivíduo portador de deficiência, um estudo do potencial cognitivo das crianças portadoras de paralisia cerebral. Para tanto observa-se os seguintes comportamentos: Físico: locomoção, coordenação motora, orientação da localização e consciência do esquema corporal. Intelectual: linguagem e seu desenvolvimento, compreensão e comunicação verbal ou não verbal, atenção, percepção, discriminação, formação de conceito, associação, habilidade para abstrair, memória, habilidade para imitar, capacidade para adaptar e resolver problemas, raciocínio, orientação no espaço, tempo e seqüência de estímulos, etc. Emocional e Social: atitude da criança em relação aos pais, ao entrevistador e as vindas ao centro de reabilitação, estabilidade, capacidade para enfrentar experiências novas e de se adaptar, recursos que possui, perseveração, tolerância à frustração. Após a observação dos dados citados acima, realiza-se um relato em que conste a qualidade do trabalho da criança e as áreas em que a criança é mais forte ou mais fraca. Assim têm-se uma avaliação qualitativa do potencial intelectual dessa criança visando orientar pais, terapeutas e professores em que áreas existe um potencial a ser explorado. Finalizando, o mais importante para os profissionais que trabalham com os indivíduos portadores de deficiência, seja no caso da paralisia cerebral ou não, é que a criança portadora de deficiência tem as mesmas necessidades de qualquer outra criança. Ela necessita ser amada, valorizada e sentir-se participante do grupo familiar.

Fonte: http://www.revistapsicologia.com.br/materias/pontoDeVista/m_pontodevista_paralisiacerebral.htm

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